A necessidade de defendermos aqueles que mais amamos e de nós dependem é tão antiga quanto a nossa própria existência enquanto espécie. E o seio familiar constituirá porventura o domínio no qual essa necessidade de defesa germina e se expressa de um modo mais óbvio, não só pelo sentimento de pertença que é normalmente conatural à relação familiar, mas também porque a família representa, quase sempre, o alfobre moldador da primeira essência pessoal dos seus membros. Mas de que família deveremos falar? Da família entendida na sua acepção mais institucional, "legalizada" e como tal reconhecida à face da ordem jurídica, ou de algo mais? Terá sentido pensarmos também nas formas de comunhão existencial que, no mundo contemporâneo, se afastam cada vez mais dos modelos tradicionais de família? E por que modo a referida necessidade de defesa se manifesta em situações limite no meio familiar, desde logo quando os supostos "objectos" da defesa são vítimas de actos que, praticados pelos seus próprios "defensores", representam, em muitos casos, o estertor da relação até então (material ou formalmente) vivida?
É a partir deste contexto que o presente trabalho tentará esboçar uma análise do relevo penal dos comportamentos cujas consequências, desfeitas as situações conjugais ou para-conjugais, ou verificado que seja um quadro de separação de facto, se abatem sobre as crianças e os adolescentes. Comportamentos amiúde perpetrados pelos progenitores, após a cessação da respectiva convivência, e que merecem, na ordem jurídica portuguesa, a partir da reforma levada a cabo pela L n.º 61/2008, de 31-10, o apodo de "subtracção de menor", prevista no art. 249.º, n.º 1-c), do CP (2), com o que isso implica da remessa de tais condutas para o elenco categorial dos factos criminalmente relevantes.