Nesta edição e não obstante a vasta dimensão da doutrina e jurisprudência referenciadas, bem como da legislação complementar incluída, mantemos a opção preferida dos nossos leitores: um único volume. Isto sem redução de conteúdos, muito pelo contrário.
Como sempre, apesar da contínua e profusa alteração das normas fiscais, a qual torna muito sensível a edição de publicações fiscais, mantemos o compromisso de rigor e de inovação, para continuarmos a consolidação da Coletânea Tributária Anotada da PwC como a obra de referência entre as coletâneas tributárias e o instrumento de trabalho offline preferencial para todos quantos se interessam pela fiscalidade nacional.
Este ano as alterações às regras de tributação voltaram a ser modestas, ainda que nalguns casos surpreendentes. Significa isto que permanecem inalterados os exagerados e insustentáveis níveis de tributação sobre famílias e empresas, implicitamente agravados pela decisão inédita de não atualização de escalões e deduções em IRS.
Ora, esta estabilidade fiscal centrada na manutenção quer das contribuições sectoriais (e.g. bancária, energética e farmacêutica – a reter para efeitos de análise da constitucionalidade baseada na provisoriedade), quer da taxa nominal do IRC acima dos 20% (a que acrescem derramas, podendo superar por essa via os 30%) e ainda em novo incremento do AIMI, não corresponde à “estabilidade” que os investidores procuram. A este quadro que se considera indesejável, há ainda que somar a abolição do incentivo à criação líquida de emprego, o qual tinha já 20 anos de bons serviços à empregabilidade.
Também fica longe do paradigma da confiança e estabilidade desejadas a divulgação dos RERT, o não aperfeiçoamento do regime dos residentes não habituais e a manutenção da ausência de menção à prorrogação deste regime decorrido o período inicial de dez anos. A confirmar-se essa impossibilidade, teremos um efeito negativo evidente no saldo líquido de residentes ao abrigo do regime, com impactos nocivos no imobiliário e, consequentemente, também no sector bancário. Mais uma vez, a introdução da figura do ex-residente corresponde a optar pelo incerto, com menor impacto e possivelmente com efeitos nocivos na internacionalização dos grupos empresariais nacionais e na congruência das grelhas salariais.
Há, no entanto, notícias positivas: a abertura de novo prazo para transição para a arbitragem tributária de processos tributários pendentes, o alargamento, mais significativo nas regiões do interior, da remuneração convencional do capital social e do regime fiscal de apoio ao investimento, a par do aperfeiçoamento das retenções na fonte de IRS (rendimentos de anos anteriores, trabalho suplementar e atos isolados). Neste quadro, porém, o legislador não foi ainda ao ponto de fracionar os rendimentos que correspondam a anos anteriores, como recomenda a Provedoria Geral da República.
Também não se concretizou a esperada alteração do regime de preços de transferência, a evolução do regime simplificado de tributação, nem a enorme subida das tributações autónomas. Mas, tantas vezes vai o cântaro à fonte. Aliás, 2018 ficou marcado pela relevância do debate da proposta orçamental na especialidade. As muitas e significativas alterações introduzidas à proposta inicial incrementarão o risco de incumprimento do objetivo orçamental, num enquadramento internacional que, no entanto, exige particular prudência.
Com efeito, o enquadramento internacional pode vir a impedir a muito necessária redução da tributação incidente sobre as famílias e as empresas. Sabemos, porém, que a descida da carga fiscal, sobretudo sobre as empresas, é crucial para a captação de novo investimento direto estrangeiro que assegure o inadiável desenvolvimento económico e social do País. E, no entanto, ao nível do alívio fiscal, mesmo sem sobressaltos orçamentais, não se aguardam mais do que meros “serviços mínimos”: manutenção, sem estragar, dos regimes de apoio ao investimento e ao empreendedorismo (agora, sem estímulo ao emprego), dos residentes não habituais (e fora do sistema fiscal, do visa gold) e do centro internacional de negócios da Madeira, tudo com manutenção da taxa nominal do IRC e derramas (com exceção da ligeira redução da taxa de IRC na Madeira para 20%).
Não obstante, como se disse, o quadro internacional, aconselha a que se mantenha uma folga relevante nas contas públicas (reduzida com a discussão na especialidade do orçamento) e conduz à imperiosa urgência de crescer mais do que a média europeia, uma região para a qual, aliás, não se prevê nada de bom em 2019. É que esta pode ser a hora da verdade para a Europa: o abandono do quantitative easing, a consequente reavaliação dos ativos, a subida das taxas de juro, a maior onerosidade das imensas dívidas públicas, as guerras comerciais e a continuada contração dos mercados europeus, acompanhando as crises das nacionalidades, das migrações, das dívidas e das gerações, trarão um ano muito difícil à Europa. E a nível extra-europeu também não há motivos para ser otimista, dado o recrudescimento das tensões financeiras, comerciais e geográficas, a possível desaceleração das regiões dominantes (China, Estados Unidos e Rússia) e a incerteza em torno das matérias primas.
Este quadro crescentemente confrontacional poderá conduzir a novas dificuldades de financiamento da República. Daí a necessidade da folga e do crescimento acima referidos. Deste modo, em caso de possível aflição orçamental, o trabalho de casa por fazer (redução estrutural da despesa pública), obrigará a recorrer a aumentos já familiares: tributações autónomas, contribuições sectoriais, taxas e, no limite, IVA. Em casos extremos, não se exclui ainda o recurso à tributação do património.
Por outro lado, o dito quadro internacional terá impacto também ao nível da fiscalidade internacional. As guerras comerciais e financeiras pela supremacia nas cadeias de valor continuarão a estimular políticas fiscais aparentemente transparentes e cooperantes, mas na realidade seletivas e concorrenciais, pelo que continuará a prevalecer a concorrência fiscal internacional, ainda que prejudicial, não obstante as declarações públicas em sentido diverso.
Em 2019 e a nível da tributação internacional, o foco deverá residir na transparência e troca de informações, na introdução prática do Instrumento Multilateral (MLI), na tributação da economia digital e no aumento do número e relevância das zonas econômicas especiais. Acentuar-se-á ainda a dicotomia entre tributação na sede versus tributação na fonte, com os velhos defensores da residência a (subtilmente) infletirem posições, dada a alteração de paradigma trazida pela economia digital (os estados europeus são hoje fonte da nova matéria prima essencial, os dados, mas não têm capacidade para a utilizar economicamente). Também por isso, deverá acentuar-se a tendência para a tributação no local de consumo.
Em simultâneo, o avanço da troca de informações, da digitização e da inteligência artificial, aumentarão a quantidade e qualidade da informação disponível, bem como a capacidade para o seu tratamento. Isto fomentará a controvérsia fiscal e testará os limites da reserva de privacidade, sobretudo, das pessoas singulares.
Jaime Carvalho Esteves