Porque escreve George Orwell? Orwell escreve porque, muito antes das redes sociais e das fake news, compreende o perigo de dar rédea solta a uma mentira («Porque Escrevo»). Orwell, o autor de Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, o criador do termo «novilíngua», escreve porque dá valor às palavras, conhece o seu poder, é sensível aos mecanismos de manipulação do pensamento por via da linguagem obscura («A Política e a Língua Inglesa», «Verdade Histórica», «Linguagem Religiosa»). Orwell, o cidadão intrínseca e fatalmente politizado, escreve porque defende que toda a arte é um gesto político, um empecilho a pretensões totalitárias, uma arma escarninha contra demagogias («As Fronteiras entre a Arte e a Propaganda», «Literatura e Totalitarismo»). «Enquanto escrevo, seres humanos civilizadíssimos sobrevoam?me, tentando matar?me», escreve Orwell, sob o fogo nazi, apontando baterias aos intelectuais ingleses desligados da realidade. E nós, porque lemos George Orwell?
«George Orwell foi um dos mais importantes ensaístas do século XX. A selecção de ensaios que John Carey preparou para a Everyman’s Library (2002) tem 1369 páginas. São artigos de dimensão variável que Orwell publicou entre 1928, altura em que assinava ainda como Eric A. Blair, e 1949. [...] Ensaios que abordam temas políticos e literários, publicados em revistas e jornais, e servidos por uma prosa magistral. Esta antologia reúne uma pequena amostra desses ensaios. [...] Orwell não é um escritor ideológico: é um escritor político, mas não ideológico, no sentido em que não procura distorcer a realidade para melhor a adaptar às suas ideias. A mentira que Orwell quer denunciar é tanto mais difícil de detectar quanto mais firmemente acreditamos nela. [...] Lemo?lo hoje porque precisamos da sua lucidez, do seu apego à verdade e do seu inimitável estilo ático. Em grande parte, porque o mundo da política é hoje mais manipulador; a sociedade, mais controlada pela publicidade e pelas grandes corporações; os governos, mais ficcionais; e a vida em geral, menos livre e honesta.» (Desidério Murcho)