Quanto ao itinerário que pretendo seguir, informo que não me irei concentrar na escalpelização particularizada do conteúdo das doutrinas metafísicas, um propósito de exorbitante desmesura, que, mesmo presumindo qualificações que de todo me falecem, só para um cômputo das possibilidades (ainda que abreviado, ou tão-só, numa amostra, indicativo), excederia largamente aquilo que os dedos de uma mão, em improvisado ábaco, consentem.
Enveredarei por outro caminho. Assim, proponho que abordemos, sucinta e sucessivamente: a) aquilo a que, à falta de melhor, chamo «a classificação bibliotecária», a partir de cujo posicionamento topológico a Metafísica, enquanto categoria, se veio a formar;
b) a basilar – e irresolvida – dualidade que no «metafísico» transparece, estando embora o afloramento sujeito a avaliações de sinal contrário;
c) o recuperado emprego metodológico da etiqueta para rotular todo um domínio funcional de formalidades principiais;
d) a adscrição genérica dos empreendimentos metafísicos à esfera de um difuso pensar da totalidade;
e) o significado de que «metafísica» e «metafísico» se revestem na contextura de filosofares dialécticos.
A concluir esta primeira parte, apontaremos algo acerca dos metafisicismos da vivência. Importa, na verdade, escrutinar mais em pormenor – de alguma maneira, ao jeito do que aconteceu com a «metafísica» (embora não em perfeito paralelo simétrico) – que linhagens principais de significado são descortináveis, não apenas no emprego histórico documentado de ontologia, mas também nas possibilidades teoréticas que o vocábulo, na sua composição, desde logo encerra. Por estas veredas, poderemos ir-nos aproximando do conjunto de questões, ou de problemas – com respostas doutrinariamente muito diferentes –, para o qual ontologia, enquanto designação unificada de um campo, remete. Do mesmo passo, se irá esclarecendo igualmente o âmbito da disciplina que, num quadro curricular institucionalizado, nos suscita atenção. No roteiro da viagem incluiremos portanto, como etapas principais: um conspecto das primeiras ocorrências do termo; uma sinalização de momentos em que a categoria sofre inflexões de sentido, que a levam a centrar-se na principialidade mais geral do ente (na «logia» do «ón»); uma passagem do interesse temático primordial da esfera do «ente» para a órbita do «ser»; um momento de interrogação acerca do «tipo» de ontologia com que se pretenda, eventualmente, reatar; e, por fim, uma tentativa de surpreender como o núcleo das questões ontológicas gira porventura em torno da pergunta por «aquilo que é», uma instância que os antigos gregos designavam por «tò ón».
José Barata-Moura